sexta-feira, dezembro 15, 2006

Talk to the Hand

Em cada um de nós há sempre um pedestre. É verdade. Porque eventualmente seremos forçados a deixar a segurança e o conforto do nosso veículo e juntar-nos ao povo incógnito (sim, porque quando conduzimos, ao menos somos uma matrícula). A ser mais um. E a sujeitar-nos ao imparável fluxo do tráfego. Imparável é a palavra. Sabem aquelas avenidas loooongas, com passadeiras pelo meio? Dessas mesmo onde ninguém pára. Pois é, há um fenómeno muito curioso que tenho a certeza que o pedestre dentro de vós já experienciou quando se aproxima de uma dessas passadeiras: é quando o condutor daquele carro, que ainda vem ali ao longe e que nos vê a avançar para a passadeira, sofre um espasmo no pé e se vê forçado a acelerar para passar a uma velocidade maior que a que seguia. E naquele borrão de cores que passa por nós ainda há uma coisa que conseguimos perceber: uma mão.

Pensem comigo: se fossem vocês o condutor, conscientes que há uma pessoa à espera para atravessar a estrada no espaço designado, aceleram propositadamente, passam pela pessoa que está, incrédula, a olhar para vocês e levantam a mão. Para quê? Pedir desculpa? Quê, estão muito arrependidos? Claro que não, se fizeram de propósito! Para mim não há muita volta a dar, levantar a mão para não deixar passar na passadeira é um acto de altivismo: «Talk to the Hand, seu miserável peão! Se não queres ser esborrachado, espera a tua vez!»; ou arrogância: «Hei, tu aí! Quietinho que já passas» ou trocista: «Olá, estás bom?». E depois disto ainda há quem atravesse a estrada satisfeito por se ter cruzado com um condutor tão educado...

ML

8 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem observado...

Anónimo disse...

É como os polícias de trânsito. Acredito que ao fim de muitos anos a fazer sempre os mesmos acenos se fartem e comecem a estilizar.

Mas numa rotunda, *eu* tenho aquela mania tola de olhar para a esquerda - só naquela, a ver se vem lá alguém - e não para onde o polícia decide enfiar-se (de preferência à direita, num recanto qualquer esconso).
Se fazem um aceno desenxabido, eu assumo que seja «passe lá, menina».

Se ele me quisesse mandar parar tinha apitado, não? Aguardarei pela multa na caixa do correio...

Anónimo disse...

O último que me fez isso, na Av. da Liberdade, levou com a pasta na porta. Travou e qd parecia que queria vir pedir explicações, perguntei-lhe se o tinha "atropelado" em cima da passadeira. Lá arrancou outra vez, o palhaço...

CP disse...

Grande Rafeiro assim é que é! é claro que quando se tem dentes afiados não há condutor que vá parar para conversar não é?

Amir disse...

Depende da época, nem sei, mas cá p'ra mim é campanha eleitoral (cof cof)...

Bacci

Anónimo disse...

como pedestre acérrima, gosto especialmente do ar indignado (se não chocado) quando os condutores se vêm obrigados a travar para me dar passagem na passadeira.

eu até me compadeço da perda de tempo monstruosa que aquilo representa para eles.

Anónimo disse...

muito bem visto....

919 disse...

sou apenas pedestre, peão (o feminino de peão é peoa?) e realmente já assisti a essa mão algumas (raríssimas) vezes e agora fizeste-me entender porque é que tenho vontade de lhes responder com o dedo médio!...