terça-feira, outubro 17, 2006

Diplomacia

As seguintes informações foram retiradas do site oficial do Ministério dos Negócios Estrangeiros (como se houvesse um site oficioso...):

Concurso Externo de Ingresso na Carreira Diplomática – 2006

O Concurso de ingresso na carreira diplomática é um concurso público externo aberto a todos os cidadãos portugueses maiores de 18 anos, possuidores de habilitações literárias do nível de licenciatura, conferida por estabelecimento de ensino superior português ou estrangeiro, e preenchendo os requisitos gerais previstos na legislação para o ingresso na função pública.

O Concurso visa o recrutamento do pessoal da carreira diplomática portuguesa, através de um conjunto de provas públicas de selecção, escritas e orais, correspondendo às especificidades das funções diplomáticas.

Nos termos do Regulamento em vigor (vide Secção I – Legislação, actos administrativos e publicitação do Concurso), o Concurso recentemente aberto (20 vagas) compreende a realização de seis (6) provas de selecção:

  1. Prova escrita de língua portuguesa;
  2. Prova escrita de língua inglesa;
  3. Exame psicológico;
  4. Prova escrita de conhecimentos nas áreas de I) Relações Internacionais e História diplomática, II) Direito internacional e Direito Comunitário e III) Política Económica e Relações Económicas Internacionais ;
  5. Prova oral de conhecimentos, com exposição de um tema sorteado no dia da prova, de entre a Lista dos Temas do Programa do Concurso, anexa ao Regulamento, seguida de questões colocadas pelo Júri ao candidato;
  6. Entrevista profissional.
Não sei se estão a pensar o mesmo que eu. Apenas um pensamento se me ocorre: que grande tanga...

Mas serei eu o único a compreender a suprema falta de visão destes homens neste país de doutores?! Licenciatura para a carreira diplomática!? Mas por que carga d'água?! Provas de conhecimentos?! Esta gente vive de certeza num mundo que não é o nosso. Por isso é que o noticiário nos bombardeia constantemente com incidentes diplomáticos. Não hão-de os Estados Unidos andar à cabeçada com o Irão e a Coreia do Norte (já não falamos de Cuba, porque Cuba e o bloqueio já se tornaram numa instituição)? Como não? A diplomacia na actualidade não é conduzida por pessoas com a necessária sensibilidade. O Mundo inteiro, ou pelo menos esses países que se chamam de desenvolvidos, tem à sua disposição um manancial de gente mais qualificada que esses doutores de trazer por casa.

E o mais interessante é que lhes passa COMPLETAMENTE ao lado. Não se apercebem que há pessoas que lidam desde tenra idade com situações de grande tensão, com níveis elevados de gravidade e que implicam um grande jogo de cintura para evitar conflitos abertos.

Estas pessoas são os Caixas de supermercado.

O Caixa é um elemento mediador de elevada importância e que adquire e acumula diariamente uma experiência sem igual e que mete inveja a qualquer diplomata formado numa universidade. Tenho ou não tenho razão? Senão reparem: imaginem a passadeira rolante onde põem as compras. Agora imaginem o supermercados às sete e meia da tarde, que é quando vocês têm tempo, entre a saída do trabalho e o chegar a casa, de comprar qualquer coisa para o jantar. Pois é... vocês e o mundo. Esse metro e meio é palco de notáveis conflitos que apenas o Caixa, graças à sua infinita sabedoria, consegue dirimir. Vejamos:

Situações de Risco Baixo:

Pagar em dinheiro ou cheque? O modo de pagamento não é, normalmente, um impulsionador directo de conflito, mas pode aumentar os níveis de impaciência na fila caso se opte pelo pagamento em numerário. A situação pode tornar-se especialmente gravosa caso a pessoa se encontre na posse de um avultado número de moedas e procure a todo o custo "facilitar" o troco e mexer e remexer à procura da moedinha de 0,02 € ou de 0,01 € que vai acertar a conta com as notas. Se a isso juntarmos um inexpressivo monólogo introspectivo acerca da localização da moeda milagrosa, então estaremos na iminência de um conflito entre o agente pagante e o seu imediato sucessor na fila. Um bom Caixa deve levar o agente pagante a pensar que já facilitou o suficiente o troco e que a sua ajuda foi inestimável para a gestão das moedas na caixa registadora. Deste modo, a pessoa abandona satisfeita o supermercado, com a sensação de dever cumprido, e a harmonia na fila de espera mantém-se.

Situações de Risco Intermédio:

Comunicação interpolada com o Caixa. Qualquer tentativa de comunicação com o Caixa antes de chegar a nossa vez é tendencialmente vista como uma violação dos direitos do agente pagante e o prolongamento no tempo dessas iniciativas pode efectivamente provocar situações de entravamento à fluência do processo de pagamento. Estas situações podem gerar casos de tensão relativamente graves que começam por um movimento considerado altamente perigoso por parte do agente pagante: o voltar-se para trás e olhar para o interlocutor. A comunicação entre os diferentes agentes pagantes é de elevado risco e nada recomendável. O contacto visual é o escalão de risco mais baixo, mas pode despoletar uma manifestação vocal, como «Que é?», que na maioria dos casos dá início a um conflito directo. A comunicação é muito perigosa e o Caixa deve esforçar-se, subtilmente, para manter os agentes pagantes na posição de segurança: todos a olharem para as costas do seguinte. Normalmente, é suficiente acelerar o registo das compras do agente pagante.

Situações de Risco Elevado:

Colocação das compras na passadeira rolante. Este processo requer a máxima atenção do Caixa, pois é a causa maior das rixas de supermercado. O Caixa deve manter sempre o separador das compras à vista para demarcação territorial do agente pagante e, na medida do possível, procurar ele próprio separar as compras de cada um. Caso o separador não se encontre à vista ou não existe, está aberto o caminho para um incidente diplomático de graves proporções causado por problemas de fronteira. Estes casos ocorrem especialmente quando o volume de compras se acumula na passadeira até restar somente um pequeno espacinho livre para as compras do agente seguinte. Caso este procure ocupar esse pequeno espaço, o agente pagante pode entender esse movimento como um avanço de tropas inimigas para junto das suas fronteiras e motivar reacções de protecção do seu próprio território: por exemplo, chegar as suas compras mais para perto do Caixa, deixar simplesmente a mãozinha a separar o território ou avançar para o escalão de alerta vermelho na comunicação entre os agentes pagantes: «Oh, minha senhora, mas não sabe esperar a sua vez?». Na gíria dos Caixas, estes casos expressam-se da seguinte forma: «Garantido que vai dar merda».

Ó Senhor Primeiro-Ministro! Com esta categoria de homens experientes e vamos buscar nerds de fatinho às Universidades?! Meta a mão na consciência!!

ML

2 comentários:

Anónimo disse...

O que coloca a seguinte questão ontológica: qual é a distãncia mínima a manter entre as minhas compras e as do precedente? E acho que devia haver coimas para infractores. Não quero as minhas laranjas contaminadas pela proximidade do queijo da serra do chabascoso atrás de mim!

Anónimo disse...

Fiquei deliciada com a subtileza da tua descrição das estratégias diplomáticas no tapete das compras !! LOLOL Os longos minutos de espera na fila do caixa nunca mais serão os mesmos ... :P

ps. esquecemos é que muitos destes caixas são eles tb licenciados ... :(